A ciência tem transformado nosso mundo moderno de maneira profunda e espetacular. Ela mexeu
tanto com cada pedacinho da vida que é impossível escapar às suas garras, para o bem ou para o mal.
Nesta lição, vamos descobrir o que é ciência. Primeiro, revisaremos os princípios e significados básicos
que têm feito da ciência a melhor maneira de definir a realidade (seção 2). Depois, introduziremos alguns
pensadores do século XX que destacaram os limites e perigos da ciência (seção 3). E terminaremos a lição
com um olhar sobre aspectos muito específicos da ciência como é praticada hoje.
No final da lição, você deverá ser capaz de:
1. Compreender o que a ciência é e o que ela não é;
2. Estar consciente de suas forças, mas também de suas limitações;
3. Estar confiante para fazer perguntas sobre a qualidade da ciência aos seus praticantes.
5.2 Diferentes caminhos para o conhecimento
5.2.1 O que é o saber? *
Nesta parte da lição, você vai aprender sobre o método de produção do conhecimento científico e verá
como distinguir a ciência de outras formas de acúmulo de conhecimento, incluindo o jornalismo científico.
É uma preocupação legítima, nesta etapa, perguntar-se o que é essa coisa chamada ciência, quando
ela começa e até onde ela vai.
A ciência começa com: “Eu quero saber”
“Saber” é tão natural e direto que tentar definir o que isso significa pode parecer estranho. Mas, na
verdade, explicar o que queremos dizer com “saber” pode ser extremamente complexo, já que este
conceito pode ter muitos significados.
Se fizermos uma lista de sinônimos, veremos que “saber” pode significar conhecer, compreender, ler
ou ver, sentir, avaliar, reconhecer, considerar, analisar, praticar ou dominar.
“Conhecer” alguém significa que encontramos uma pessoa (pessoalmente ou por meio de seus
feitos), que podemos reconhecê-la dentro de um grupo e que estamos cientes de sua existência.
Mas, para realmente conhecer alguém, você deve conhecer a pessoa de tal forma que possa prever
seu comportamento e suas reações, assim como compreendê-la o bastante para explicar sua
personalidade a terceiros.
“Conhecer” um tema, fato ou fenômeno significa que você pode descrevê-lo visual e virtualmente,
explicar como ele interage com outros objetos ao seu redor e dizer como ele influencia seu ambiente e
é influenciado por ele.
* Nota do tradutor: A palavra em inglês “know” pode ser traduzida tanto por “conhecer” quanto por “saber”. A tradução foi feita nesta lição ora
por uma palavra, ora por outra, considerando as especificidades do português.91
O que é ciência?
No contexto da ciência, “saber” significa exercitar a curiosidade, observar e coletar informação
suficiente para identificar, distinguir e descrever as diferentes características da realidade da
forma mais verdadeira. Essa “realidade” pode ser real, virtual, concreta, natural, artificial, abstrata, física
ou metafísica.
E o exercício da curiosidade produz conhecimento.
Na maioria das vezes, o conhecimento torna possível usar a razão e eventualmente desenvolver
argumentos racionais.
Você é racional ou irracional?
Racionalidade é a essência do que é racional, é o produto da razão.
A raiz da palavra “racionalidade” (do latim ratio) significa “cálculo”.
Razão não é o mesmo que intuição, sensação, reação espontânea, emoção ou crença. A razão começa
com o senso comum e se desenvolve por meio da habilidade de contar, medir, ordenar, organizar,
classificar, explicar e argumentar.
O discurso racional, então, é aquele que é coerente, ponderado e construído numa espécie de
“cálculo” lógico, o que é bem diferente de uma opinião pessoal. Este tipo de discurso deve ser
universalmente verdadeiro.
A irracionalidade, porém, se recusa a estar submetida à razão. Um indivíduo irracional não segue a
lógica e age segundo propósitos desordenados. Suas decisões são frequentemente incoerentes. O
mundo irracional pode ser relacionado também ao mundo do desconhecido, da superstição, do
misticismo e do inacessível, incluindo o que acontece contra a razão.
Onde começam as crenças?
Começamos a desvendar “qual é o significado do conhecimento” quando refletimos sobre o que
é “conhecer”.
O conhecimento objetivo ocorre quando analisamos as coisas como elas são, mantendo uma certa
distância das nossas opiniões pessoais. É um modo erudito de conhecimento e avaliação, que traz em
si um tipo de poder de rejeitar, refutar, adotar, manter certa distância e até modificar a maneira como
as coisas são. O conhecimento vem com a obrigação de fazer perguntas e desafiar nossa ignorância.
“Conhecer” alguma coisa torna possível aplicar a razão, observar e analisar.
Uma forma diferente de conhecimento são as crenças. Crenças são uma maneira de explicar o
universo atribuindo-lhe capacidades, qualidades, sentimentos e emoções. Crenças dão às coisas
um significado intrínseco. Por exemplo, para algumas pessoas, o número 13 é considerado um mau
agouro. Em algumas culturas, o arco-íris é um aviso de que coisas ruins estão para acontecer – ele
é a espada de Deus –, enquanto, em outras, ele pode indicar onde está escondido um tesouro – é,
portanto, um bom presságio.
Crenças requerem aceitação e compromisso imediatos; elas criam raízes no nosso íntimo. Crenças
religiosas são uma busca pessoal e íntima pela verdade. As declarações e proposições que vêm
com as crenças precisam ser aceitas por seu valor intrínseco. O conhecimento religioso requer
aceitação de fatos e enunciados que não podem ser demonstrados. A existência de Deus não é um 92
Curso On-line de Jornalismo Científico
objeto da ciência, mas uma crença, já que não há maneira de demonstrá-la ou negá-la. Budismo,
judaísmo, hinduísmo, cristianismo e islamismo são algumas das grandes religiões que influenciaram e
continuam influenciando a história da humanidade.
5.2.2 Conhecimento do senso comum ou cotidiano
O que é conhecimento do senso comum? E como ele se difere do conhecimento científico?
Na prática, “saber” exige fazer perguntas, duvidar e checar os fatos, objetos e ideias.
Mas podem existir diferentes graus de questionamento. Na vida diária, os objetos com os quais
interagimos nos dão uma experiência concreta e imediata das coisas. Nossos sentidos, por meio do
que vemos, tocamos, cheiramos, provamos e ouvimos automaticamente – sem pensar –, nos dão
respostas diretas, evidentes e familiares sobre a realidade. Essas respostas têm sua raiz na tradição.
Esse conhecimento do dia-a-dia também é chamado conhecimento do senso comum, sensível,
primário ou imediato. Suas explicações são baseadas em enunciados amplos, a maioria proveniente
da tradição oral. Essas explicações são aceitas sem questionamento. Elas são, frequentemente,
generalizações rápidas e brutas. São baseadas em observações simples: dizemos que o Sol se levanta e
se põe, vemos que o céu é muito “alto”. O conhecimento do senso comum não planeja mudar as coisas.
Como criamos o conhecimento de senso comum
Construímos o conhecimento de senso comum por meio de acasos com que nos deparamos ao longo
da vida. Grande parte dele passa de uma geração para a outra sem evoluir.
O conhecimento de senso comum aparece do nosso contato diário com o ambiente e com a maneira
como as culturas descrevem o universo. Ele é construído e transmitido pelas nossas famílias, parentes,
amigos, vizinhos, parceiros, tribos ou comunidades. É essa comunidade humana, nossa comunidade
mais importante, que compartilha suas formas de viver, alegrias, preocupações, dores, desejos para o
futuro, percepções do presente e lembranças acerca do passado e das tradições. E esse conhecimento
do senso comum envolve superstição.
No que diz respeito ao que aprendemos pelos sentidos – no contexto do conhecimento do senso
comum –, nós atribuímos à natureza virtudes e emoções, intenções e reações similares às dos
seres humanos.
Apesar das limitações do conhecimento de senso comum de nossa tribo ou comunidade, a vida não
seria possível sem esse conhecimento. Nós racionalizaríamos o tempo todo, hesitando e sempre
decidindo tarde demais. O conhecimento de senso comum oferece respostas prontas para questões
corriqueiras, cotidianas, frequentes.
Conhecimentos de senso comum existem em todas as culturas e civilizações. Cada um de nós entra
em contato com o conhecimento de senso comum em nossas vidas diárias e interações com os outros
membros da comunidade. Os próprios cientistas começam com o conhecimento de senso comum,
mas vão além dele.